ARTIGO - Carlos A. Di Franco
Acabo de regressar da Europa. Uma intensa semana, na Itália e na Espanha, é sempre formidável. Da magia da Piazza Navona ao encantamento da Gran Via, sempre vale a pena. Impressionou-me, na leitura dos jornais e nas conversas com jornalistas e professores, a presença de uma nuvem escura que, aos poucos, vai toldando o horizonte da juventude europeia: o avanço das drogas. Na Europa, e aqui no Brasil, uma nova droga destruidora ameaça a juventude: a cápsula do vento. Trata-se de um pó branco, de aparência comum, mas demolidor. É um derivado da anfetamina e tem propriedades alucinógenas. Seus efeitos podem durar horas. Existem relatos de pessoas que ficaram até uma semana sob efeito alucinógeno dessa substância. O usuário pode ter alterações cardíacas, convulsões, fortes alucinações e chegar à morte.
O uso de drogas ilícitas no mundo vem crescendo, apesar dos esforços mundiais de controle. O aumento no consumo das drogas sintéticas é considerado atualmente pelo Escritório da ONU de Combate ao Crime e às Drogas (Unodc), como "o inimigo público número um". Ao contrário das drogas tradicionais, feitas à base de plantas, as drogas sintéticas são feitas com produtos químicos facilmente obtidos em laboratórios improvisados. O combate é, por isso, muito mais difícil.
O uso das drogas sintéticas hoje é uma questão de moda. Assim como vimos, nos anos 60, o crescimento do uso de LSD e heroína ligado ao movimento hippie, hoje há a cultura da música tecno, que incentiva o uso de drogas como o ecstasy. Essa situação preocupa, porque vai mudar o paradigma do combate às drogas. A prevenção vai ganhar uma importância muito maior do que a repressão.
Nessa década, o maior problema que nós vamos vivenciar é a droga sintética. Principalmente o ecstasy. As prisões de traficantes são um forte indicador da presença das drogas sintéticas e, ao mesmo tempo, revelam um novo perfil do tráfico: jovens universitários, de classe média e alta, compõem o novo mapa do crime. O rosto do usuário também vai sendo perfilado: boa escolaridade, inserido no mercado de trabalho e pertencente às classes sociais mais privilegiadas.
O ecstasy é uma droga estimulante e alucinógena. Segundo o professor Ronaldo Laranjeira, da Universidade Paulista (Unifesp), "ela foi sintetizada para ser um novo moderador de apetite, mas foi descartada pelo laboratório químico que a produziu porque era muito tóxica. Ficou na prateleira por várias décadas e foi redescoberta na década de 70 para ser a droga do amor. Depois se transformou na droga mais usada em discotecas". O ecstasy desencadeia transtornos psiquiátricos como síndrome do pânico e depressão. Costuma vir acompanhado de taquicardia e aumento da temperatura do corpo e tem sido a causa de inúmeras mortes. Segundo Ronaldo Laranjeira, "o grande problema do ecstasy é o dano cerebral que a droga produz, principalmente nos neurônios responsáveis pelo prazer".
O cardápio macabro das baladas, infelizmente, tem sempre novidades. Duas novas drogas foram introduzidas no menu das raves: a ketamina e o GHB. A ketamina, também conhecida por cetamina, ou special K, é um anestésico usado em cirurgias e animais. É um parente químico do ácido lisérgico, o LSD. "O principal efeito que provoca é o desprendimento corporal, o sujeito consegue se dissociar do corpo. O uso frequente da droga pode causar danos na atenção, na memória, no estômago, coração e fígado", alerta o psicólogo Murilo Battisti. O GHB, também chamado de ecstasy líquido, não tem cheiro nem gosto. É perigosíssimo, principalmente quando misturado com álcool. Ambos - GHB e álcool - diminuem muito a atividade do cérebro. Associados, o efeito é ainda maior. O GHB é uma droga fortemente depressora. Pode levar ao coma e induzir ao suicídio.
Como vê, caro leitor, a escalada das drogas é um fato assustador. Enfrentá-la só é possível com informação correta, prevenção e recuperação. Meu objetivo, neste artigo, é ajudá-lo a dar os dois primeiros passos: conhecer o que se passa no ambiente rarefeito de inúmeras discotecas e raves e entender as características devastadoras das novas drogas sintéticas. Só assim, com informação clara e sem eufemismos, você poderá captar eventuais mudanças comportamentais e dar uma orientação segura aos seus filhos. A família, um espaço de carinho, diálogo e firmeza, exige presença do pai e da mãe. Ela é, de fato, o pré-requisito da prevenção. Quando a família fracassa, as políticas antidrogas acabam se transformando no cemitério de boas intenções.
O terceiro passo, a recuperação, é uma indeclinável responsabilidade dos governos. É preciso que os governantes ajudem para valer os serviços especializados e as instituições idôneas que, anonimamente e com grande sacrifício, investem na recuperação de dependentes químicos. Trata-se de um problema de saúde pública. Recuperar é salvar vidas e multiplicar aliados na luta contra as drogas. Um dependente recuperado é o melhor prosélito das campanhas preventivas. Impõe-se que os responsáveis pelo combate às drogas abandonem o conforto de seus gabinetes e entrem em contato com o verdadeiro drama dos adictos. Eu fiz isso. Não considero correto escrever e opinar a respeito de uma realidade distante. Conversei com especialistas, ouvi relatos de dependentes químicos, visitei comunidades terapêuticas que apresentam elevados índices de recuperação, desenvolvi, enfim, um trabalho de reportagem.
Espero que o governo faça a sua parte. Segundo me consta, o Congresso Nacional está decidido a arregaçar as mangas e entrar num autêntico mutirão em prol dos que lutam pela recuperação. A iniciativa, se confirmada, merece os aplausos da sociedade. A dependência química não admite politicagem. Reclama, sim, seriedade e realismo.
Carlos Alberto Di Franco
Doutor em Comunicação, professor de Ética e Diretor do Master em Jornalismo.
Fonte: Estadão
adorei esse site...
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