A doença que veio da tecnologia
Vivemos em mundo digital e já não podemos negar nosso envolvimento com a tecnologia. Podemos, sim, estar mais ou menos conectados, mas não dissociados desta realidade.
Seria até um despropósito negar as vantagens e as contribuições da tecnologia. Contudo, é preciso ter critério, pois, também nos deparamos com uma leva de problemas. Fora os já conhecidos, enfrentamos uma espécie de humanização descabida dessa tecnologia. Parece que, para algumas pessoas, o ser humano pode ser substituído pelos recursos oferecidos pelo mundo digital.
Neste cenário, surge a cybercondria, um mal desenvolvido a partir da tecnologia, que é como um crescimento da hipocondria, uma extensão de um problema real no mundo digital.
Os cybercondríacos tentam se diagnosticar fazendo buscas na internet, baseando-se em sintomas, resultados de exames e remédios. Apenas de não haver análise profissional, essas pessoas acreditam que o resultado de sua busca já é o suficiente para iniciar seu tratamento.
Pode parecer prático, mas o diagnóstico por meio de informações com o uso da internet é arriscado e, na maioria das vezes, inútil. Há um risco alto de automedicação errônea, ocultando alguma doença grave e desencadeando outras, como ansiedade e síndrome do pânico. Ou de facilmente transformar um simples mal-estar em uma doença grave.
Vemos nesse mal contemporâneo também um comportamento que está ganhando força e que, cada vez mais comum, representa um perigo para os tratamentos clínicos: acreditar que os mesmos sintomas indicam um mesmo diagnóstico. Esse equívoco está banalizando a psiquiatria.
Um sintoma pode significar diversos quadros e, por isso, não é possível classificar a doença. Devem ser levados em consideração diversos fatores, como história clínica do paciente e exames físicos, radiológicos e laboratoriais, entre outras técnicas, que complementem os sintomas. É imprescindível a participação de um profissional médico para analisar e diagnosticar o paciente, pois a entrevista clínica e o exame clínico são orientadores para se diferenciar diagnósticos que apresentam os mesmos sintomas. Também é essencial que as recomendações do médico sejam seguidas. Em muitos casos, o paciente, quando chega ao consultório, leva a sua análise exigindo do profissional um tratamento para o seu problema e, em geral, se recusa a ser avaliado.
Vale ponderar que este alerta não invalida que o paciente obtenha informações sobre saúde ou consulte mais de um profissional para comparar os diagnósticos. Informar-se é pressuposto importante dos princípios da prevenção e deve ser estimulado. É preciso, porém, saber qual é a dose certa.
Por José Toufic Thomé - psiquiatra e psicoterapeuta, coordenador da secção de intervenção em crises e traumas da Associação Brasileira de Psiquiatria.
Publicação: Jornal da Tarde (01/10/10)
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