sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Opinião: Saúde e lucro

Vocês sabem, caros leitores, quanto os planos de saúde pagam a um médico por uma consulta? Entre R$ 35 e R$ 42. E um corte de cabelo, quanto custa? De R$ 30 a R$ 100.

E para lavarem nosso carro? Eu, por exemplo, pago R$ 30 por quinzena. E uma tosa num cachorrinho? Sei quem paga R$ 80, sem reclamar.

Bem, esses números servem para mostrar alguns distorções absurdas na relação Estado-paciente-médico-operadora. Esse último segmento, aliás, "dono" de 30 mil processos administrativos na ANS, a agência que regula (ou deveria regular) o setor. Mas essas informações numéricas não servem para justificar o pacotão de estupidez diária visível na rede privada de atendimento hospitalar. Nas emergências, as filas são assustadoras. Nelas, por sinal, o atendimento costuma ser triplamente rude, grosseiro: do vigilante, do atendente e, por fim, do especialista. Nas salas de cirurgia, há mais erros do que é exposto comumente: por falta de conhecimento técnico e pelo conhecido espírito de corpo da categoria, pouca gente denuncia. Nas alas de enfermagem e laboratórios, vê-se gente desqualificada a granel.

Em suma: paciente é mercadoria — um número apenas. Em determinado hospital, que tem nome de santa, quem for fazer uma cirurgia, mesmo programada, vai direto para uma antessala do centro operatório, troca de roupa num cubículo unissex e entra na faca. Em estabelecimentos sérios, o paciente costuma ir para um quarto, se preparar física e psicologicamente — afinal, por mais simples que seja, qualquer procedimento do tipo desperta angústia e medo. E aí, a quem recorrer? Esqueça qualquer sentimento ético ou pureza naquelas frases pregadas nas recepções falando de "nossos valores" e "nossa missão": a competição, a ânsia desmesurada por lucro fácil e a leniência estatal não oferecem mais do que temos.

A não ser... A não ser, entre coisas, que tomemos vergonha na cara e reclamemos das agressões que sofremos. Agressões como a declaração recente do diretor de Fiscalização da ANS, Eduardo Sales: "Os reajustes das operadoras subirão sempre acima da inflação", disse o burocrata. "Sempre." Enquanto a burocracia pensar como ele, enquanto a saúde for tratada como mercadoria... Bem, é preciso urgentemente que o Estado dê atenção à atividade hospitalar privada: fiscalize, puna, feche os precários. Não, não se trata de livre mercado. É questão de vida — e de morte, em muitos casos.

Autor: Renato Ferraz.
Publicdo no jornal Correio Braziliense.

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