O engenheiro civil Hélder Rossi, 57 anos, é um dos raros pacientes que conseguiram alterar uma dura realidade psicológica. Oito anos após o início do combate à depressão, com os recursos de um tratamento psiquiátrico combinado com a psicoterapia, o mineiro que adotou a capital do país como lugar para morar pode dizer que saltou a barreira de cerca de 30 milhões de brasileiros que convivem com o distúrbio. O caso de Hélder elimina preconceitos e mostra que é possível estabilizar ou mesmo superar uma doença que afeta de 15% a 20% da população mundial, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS).
“O que tenho a dizer a quem enfrenta esse problema é que deve acreditar em si mesmo, em primeiro lugar. Depois, deve seguir o tratamento com rigor e escolher bons profissionais”, orienta Rossi, que recebeu alta em 2009 e desde então faz apenas uma sessão por mês de terapia de grupo. “Não preciso mais de remédios, levo uma vida normal e se eu soubesse antes que esse tratamento me faria tão bem, teria começado aos 15 anos.”
As estatísticas da agonia em que vive mergulhado um exército de cerca de 1 bilhão de pacientes do chamado Mal do Século, no entanto, não são muito favoráveis para a saúde do planeta — considerando-se a pressão de tantos fatores depressores que alfinetam o dia a dia da vida moderna na era da velocidade e do frenesi tecnológico. Ainda segundo a OMS, a depressão é responsável por cerca de 14% do ônus mundial com incapacidade para o trabalho. Somente nos Estados Unidos, as perdas anuais com tratamentos, internações e doenças coadjuvantes causadas pela depressão atingem um montante de exorbitantes US$ 83 bilhões.
“Quando se fala em prejuízos causados por depressão a gente se refere não apenas à mortalidade, mas aos anos perdidos de trabalho, aos custos do tratamento, e tem uma questão importante de frisar: pessoas com quadros depressivos não tratados vão ter uma vulnerabilidade muito maior para doenças clínicas como diabetes e doenças cardiovasculares”, explica o psiquiatra José Cássio Pitta, professor da Universidade Federal de São Paulo (leia entrevista).
Segundo o especialista, que dirige os serviços psiquiátricos do Hospital São Paulo, na capital paulista, os quadros que mais comprometem o desempenho profissional são os depressivos, os de transtorno bipolar, o de alcoolismo e o de esquizofrenia, que incapacita 1% da população. “Alguns estudos mostram que 44% dos pacientes com depressão têm sua capacidade de trabalho afetada, enquanto 11% atribuem o desemprego à doença.”
Foco no debate
A estrela das controvérsias e das preocupações depositadas nas mesas-redondas do 29º Congresso Brasileiro de Psiquiatria, realizado de 2 a 5 de novembro, no Rio de Janeiro, e que suscitou mais discussões entre os especialistas não foi outra senão a depressão — forte candidata a ser, em 2020, a segunda causa de incapacidade no mundo, depois das doenças cardiovasculares. Uma das razões para elevar a doença ao pódio dos debates é antiga. Vem se arrastando como ponto de discórdia desde que a psicose maníaco-depressiva (PMD) passou a se chamar transtorno bipolar (TB), na década de 1990, e os diagnósticos começaram a se bifurcar entre o que seria depressão e o que seria TB.
Uma revisão do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais IV, da Sociedade Americana de Psiquiatria, foi bastante debatida, mas sempre derrapa nos eixos da harmonia quando este propõe em sua versão de número cinco, ainda a ser editada, métodos de diagnósticos mais ou menos controversos para o TB e a depressão.
“O problema é que há um excesso de diagnóstico de depressão e há pessoas com bipolaridade sendo tratadas como pacientes de depressão. Isso pode ser muito prejudicial ao paciente. O transtorno bipolar associa depressão com mania; a depressão apresenta um quadro clássico de sintomas que não se resume à tristeza, mas se alia ao desânimo, à apatia e a outros sinais”, avalia a psicóloga Marilda Lemos Vieira.
O engenheiro Hélder Rossi é um exemplo de depressão moderada. Os alertas de que necessitava de ajuda vieram em 2002, após a separação. “Sempre tive dificuldade de lidar com perdas e isso deve ter relação com o fato de eu ser o quarto filho após três irmãos natimortos.” Rossi não chegou a abandonar o trabalho na sua empresa de construção civil. “Não tinha forças para nada, não queria levantar da cama, mas mesmo assim trabalhava. Não podia me entregar.” Com o tempo, Hélder melhorou e casou-se outra vez. Hoje, garante que a depressão não é o fim. “Tem saída.”
Publicado no portal Pernambuco.com
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