quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Artigo: Liberdade de expressão.

O Senado Federal está prestes a apreciar em segundo turno a PEC dos jornalistas. Trata-se de emenda à Constituição instituindo a exigência de diploma para exercer a profissão. A opção de inserir o tema no texto da Lei Maior se deu pelo posicionamento já firmado pelo Supremo Tribunal Federal de que qualquer norma nesse sentido é inconstitucional por ferir a liberdade de expressão. Acreditam os idealizadores da PEC que, ao alterar a Carta Magna, aquele princípio basilar da democracia estará atendido, o que não procede.

Porém, mais do que a impertinência, a proposta poderá configurar o embrião, a gênese de futuro controle social dos meios de comunicação ou, em outras palavras, da própria censura. O primeiro passo é exatamente a regulação da profissão mediante a exigência de diploma para seu exercício.

O segundo passo será regulamentar a emenda por lei ordinária, já que aquela carece de sanções pelo seu descumprimento, o que a tornará inócua ou letra morta. O terceiro passo, atrelado à regulamentação da emenda, será a criação do respectivo conselho profissional, nos moldes do Crea, da OAB, do CFM, entre tantos outros.

A justificativa será a de viabilizar a necessária fiscalização do cumprimento da lei. Para tanto, necessitará do poder público concedido a essas autarquias corporativas, que detêm a prerrogativa de multar, embargar o funcionamento ou propor o fechamento de empresas do setor, além de cassar licença para o exercício da profissão.

Com a criação do órgão de fiscalização, institui-se também o julgamento ético dos profissionais nele registrados, pois essa é uma das principais funções desses conselhos. Ocorre que, quando se fala em atividades relacionadas à manifestação de opinião e à liberdade de expressão, isso se torna extremamente perigoso.

A reboque do poder de julgamento ético de conduta, ou mesmo de imputação de sanções às empresas, sempre haverá o risco de passar a existir o denuncismo, as ameaças de representação ou abertura de processo, as chantagens, as negociações e barganhas para condenar ou absolver, os conflitos de interesses e tudo mais que envolve esse universo da fiscalização e do julgamento. É um campo fértil de possibilidades que acabarão, de uma forma ou de outra, comprometendo o trabalho do profissional e das empresas de comunicação.

Em suma, é muito tênue a linha que separa o controle do exercício profissional do controle do conteúdo do trabalho desse mesmo profissional. Mais ainda quando se trata das empresas desse setor, pois há o entendimento de que pessoas jurídicas também exercem a profissão e, portanto, são passíveis de registro no conselho e, consequentemente, submetidas a julgamentos, multas e outras sanções. Os mecanismos e instrumentos para tanto são muitos, principalmente a depender do poder que o Estado conceda a essas autarquias ao criá-las por lei.

Os conselhos de fiscalização profissional, além do poder de fiscalizar e julgar, possuem a competência para legislar por atos e resoluções naquilo que for afeto ao exercício da respectiva profissão.

O desenrolar disso tudo é imprevisível, especialmente por se tratar de serviços — a notícia, a opinião, o comentário — que chegam de forma indiscriminada a toda a população de uma só vez, diferentemente do que ocorre com as outras profissões, cujo exercício se restringe a um contrato entre profissional ou empresa e um ou poucos clientes.

A presidente Dilma Roussef já se manifestou contrária ao controle dos meios, principalmente através de um conselho que, vale lembrar, pode vir revestido de qualquer nome, característica ou natureza. Porém, a Constituição pretende ser eterna, acima dos governos temporários. Que garantia teremos no futuro de que o pensamento de ocasião será o mesmo do da atual titular da Presidência da República? Não por acaso, a maioria dos conselhos profissionais foi criada em períodos de exceção, como o Estado Novo e os governos militares, quando o controle e a restrição eram palavras de ordem.

A própria regulamentação inicial da profissão de jornalista remonta a 1938, depois a 1969 e, finalmente, a 1979. Portanto, há de pensar a longo prazo, de preferência impedindo, já de agora, o vírus que se pretende inocular para restringir ou mesmo amputar a completa liberdade de expressão. No fundo, ao final do processo, será o ressurgimento da censura no país, ainda que com outra roupagem, de forma dissimulada e escamoteada.

Autor: Fernando Collor.
(senador por Alagoas)
Artigo publicado no jornal Correio Braziliense.

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